A falta de lei regulamentando a licença-paternidade, que é assegurada no artigo 7º da Constituição Federal, constitui omissão inconstitucional por parte do Congresso Nacional. O entendimento é do Plenário do Supremo Tribunal Federal, que determinou, nesta quinta-feira (14), que o Legislativo edite lei para regulamentar a licença-paternidade no prazo de até 18 meses.
O momento não poderia ser pior para o Congresso: o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, vitaminou uma PEC midiática que teria por objetivo restringir as decisões monocráticas dos ministros. O problema, na verdade, não está no poder de decisão dos juízes do Supremo, mas na ampla omissão dos parlamentares na produção de leis receitadas pela Constituição — e até hoje não regulamentadas.
No julgamento, venceu o voto reajustado do ministro Edson Fachin, que divergiu do relator, Marco Aurélio (aposentado). A tese foi acompanhada por unanimidade. Segundo Fachin, a ausência de regulamentação sobre licença-paternidade contribui para o tratamento desigual entre homens e mulheres e reforça o estereótipo de que mulheres são cuidadoras, enquanto homens são provedores.
“É preciso considerar que muitos ganhos históricos da igualdade de gênero somente foram possíveis quando homens e mulheres se uniram em direção ao objetivo único e comum de construírem juntos uma sociedade mais igualitária”, disse o ministro em seu voto quando o caso ainda era analisado no Plenário Virtual.
O caso foi suspenso por pedido de destaque e reiniciado na quarta-feira (13/12), com o voto do ministro Luís Roberto Barroso. O presidente do Supremo afirmou que há uma diferença radical entre o prazo da licença-maternidade e da da licença-paternidade, o que não reflete a evolução dos papéis de homens e mulheres na família e na sociedade.
“A radical diferença produz impactos negativos e desproporcionais sobre igualdade de gênero e sobre direitos das crianças. Institucionaliza óbice e manutenção das mulheres no mercado de trabalho em oposição aos homens. Contribui para sobrecarga imposta a mulheres”, disse Barroso.
Ele também afirmou que a regra atual protege “de forma insuficiente os direitos dos homens e os exime dos deveres da paternidade”, como se os pais não fossem corresponsáveis pela criação dos filhos.
O tribunal fixou a seguinte tese:
“1- Existe omissão inconstitucional relativamente à edição da lei regulamentadora da licença-paternidade prevista no artigo 7º, inciso XIX, da Constituição.
2- Fica estabelecido o prazo de 18 meses para o Congresso sanar a omissão apontada.
3- Não sobrevindo a lei regulamentadora no prazo acima estabelecido, caberá a este tribunal fixá-lo”.
Licenças
A licença-paternidade é atualmente de cinco dias, enquanto a maternidade é de 120 dias. Empresas podem aderir ao Programa Empresa Cidadã. Nesse caso, a licença-maternidade passa a ser de 180 dias, enquanto a licença-paternidade dura 20 dias. Os ministros consideraram esse período insuficiente.
Na ação, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) argumentava que, apesar de a Constituição de 1988 ter previsto o direito à licença-paternidade, a medida nunca foi regulamentada em lei própria. Por isso, continua sendo aplicada a licença de cinco dias prevista no parágrafo 1º do artigo 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).
A ação começou a ser julgada no Plenário Virtual, mas foi destacada pelo ministro Barroso para julgamento presencial. Nos votos apresentados na sessão virtual, havia maioria para reconhecer a omissão, permanecendo a divergência quanto ao prazo para a adoção das medidas legislativas necessárias para saná-la.
Omissões legislativas
O senador Rodrigo Pacheco mexeu em um vespeiro ao tentar capitalizar sobre a impopularidade do Supremo junto ao eleitorado bolsonarista. Ele escolheu como argumento o fato de o STF suprir as omissões do Congresso, que há 35 anos evita legislar sobre temas espinhosos, como aborto e descriminalização do uso de drogas.
A regra que dá ao Supremo o papel de substituir o Congresso foi criada na Constituição Federal, com o nome de mandado de injunção. Em 2013, o Senado criou uma comissão para oferecer solução para os mais de cem dispositivos da Carta de 88 não regulamentados até hoje pelos congressistas. Indagado sobre os resultados da comissão, em outubro, Rodrigo Pacheco disse desconhecer o tema.
Da Reportagem Jornal do Trabalhador
com informações Conjur_