Ao validar a adoção da jornada de trabalho de 12 por 36 horas por meio de acordo individual, o Supremo Tribunal Federal referendou a reforma trabalhista de 2017, oferecendo maior segurança jurídica ao tema, no entendimento de especialistas na área trabalhista ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico.

Em julgamento virtual finalizado no último dia 30, o Plenário do STF estabeleceu que o inciso XIII do artigo 7º da Constituição não proíbe a jornada de 12 horas de trabalho por 36 de descanso. O dispositivo, de acordo com o que foi decidido pelo colegiado, apenas estabelece que a jornada de oito horas diárias ou 44 horas semanais pode ser relativizada mediante compensação, conforme acordo ou negociação coletiva. No modelo 12 x 36, as quatro horas a mais de jornada diária são compensadas por uma quantidade maior de horas consecutivas de descanso.

A maioria do Plenário seguiu o voto do ministro Gilmar Mendes, que considerou “natural” que a reforma normatizasse a jornada 12 x 36 na CLT e permitisse sua adoção via contrato individual, “com base na liberdade do trabalhador”. O magistrado lembrou que tal modelo já era amplamente aceito na jurisprudência. Antes da reforma, a Súmula 444 do Tribunal Superior do Trabalho validava a jornada 12 x 36 de forma excepcional, caso prevista em lei ou ajustada em negociação coletiva. Além disso, o STF já permitiu a estipulação dessa jornada para bombeiros civis.

Aloizio Lima, sócio da prática trabalhista do escritório Lefosse, diz que a decisão pacifica o entendimento a respeito da aplicação e da legalidade da jornada de trabalho 12 por 36 horas, que é observada na organização das rotinas de trabalho de diversos setores da sociedade, como saúde e segurança.

“A decisão traz segurança jurídica aos acordos individuais firmados nesse sentido, afastando controvérsia acerca da necessidade de negociação coletiva para legitimar tal jornada, permitindo maior flexibilidade e poder negocial nas relações de emprego.”

Segundo o advogado, diferentemente de alguns julgamentos recentes, nos quais se observou maior destaque às negociações coletivas, a decisão do STF excluiu a participação obrigatória da entidades sindicais na definição da prática de jornada 12 x 36.

“A decisão reforça o tom da reforma trabalhista relacionado à prevalência da negociação no âmbito da relação de emprego, retirando a necessidade de que todo e qualquer tema de maior relevância seja discutido por meio de negociação coletiva junto às entidades sindicais, panorama que perdurava até o advento da Lei 13.467/2017.”

Para o professor, parecerista e consultor trabalhista Ricardo Calcini, a decisão vai na mesma linha daquilo que, do ponto de vista coletivo, já era feito envolvendo sindicatos, profissionais e empresas.

“É uma decisão em conformidade com os próprios parâmetros previstos na Constituição Federal, já que a temática envolvendo jornada de trabalho tem, por força da previsão da própria Constituição, que essa negociação possa ser realmente validada. Claro, a intenção do legislador de 1988 era de que essa negociação fosse implementada via coletiva. Ocorre que o legislador de 2017 ampliou essa possibilidade, já que há essa norma permissiva de que o tema jornada de trabalho possa ser pactuado desde que respeite o mínimo existencial estabelecido pelo próprio Supremo Tribunal Federal no Tema 1.046, quando tratou da prevalência do negociado sobre o legislado.”

Eduardo Alcântara Lopes, sócio da área trabalhista do Demarest Advogados, avalia que a decisão do Supremo é positiva e referenda um comportamento comum nos acordos entre trabalhadores e empregadores. Na avaliação dele, o julgamento não deixou pontos de inflexão, entendendo-se corretamente a jornada de 12 por 36 horas dentro do conceito previsto no artigo 7, XIII, da Constituição.

“A decisão vem para dar maior força à reforma trabalhista, tão questionada atualmente, bem como para referendar um comportamento adotado há anos por empregadores e empregados, viabilizando, assim, diversos modelos de negócios que estão estruturados com base na jornada 12 x 36.”

Segundo Alcântara Lopes, “a possibilidade de adoção da aludida jornada pelo acordo individual não altera a possibilidade de atuação dos sindicatos em defesa dos interesse da categoria profissional, de modo que a tese sustentada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde no julgamento não se sustenta. Não há aqui flexibilização de direitos trabalhistas em desfavor da categoria profissional”.

Estratégias sindicais
De acordo com João Guilherme Walski de Almeida, advogado e mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), após quase seis anos de vigência, ainda existem dúvidas quanto à constitucionalidade de certos dispositivos introduzidos pela reforma trabalhista. E, para ele, a decisão do STF gera preocupação sobre a importância da negociação coletiva, “instituto escolhido pela Constituição Federal para ajuste de situações excepcionais entre empregadores e sindicatos”.

“Para as empresas, a decisão garante maior segurança jurídica. No entanto, a decisão do STF também reforça a necessidade de as entidades sindicais buscarem melhores estratégias para proteção e bem-estar dos trabalhadores abrangidos, tendo em vista que o regime 12 x 36, cuja adoção foi flexibilizada, pode ser nocivo à saúde dos trabalhadores.”

Já André Ricardo Lopes, advogado, professor e integrante do escritório Gasam Advocacia, acredita que a decisão se deu de forma temerária. “Por ‘negociação’ ou ‘acordo’, compreendem-se mútuas concessões entre as partes, mas é sabido que em situações como essa os trabalhadores não têm a opção de apresentar qualquer questionamento nesse sentido, pelo simples fato de serem a parte hipossuficiente da relação.”

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ADI 5.994

Da Reportagem Jornal do Trabalhador

com informações Conjur 

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